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segunda-feira, 29 de março de 2010

Quando cheguei a Angola













Gabela, cidade maravilhosa nos anos 60

Ao chegar a Luanda estava, á nossa espera, o meu pai que o já não via á 4 anos. Eu, a minha mãe e uma das minhas irmãs, seguimos na cabine de um camião, uma velha Scania, que fazia transportes de mercadorias entre a cidade da Gabéla e Luanda. O meu pai seguiu com as outras irmãs, num carro ligeiro. Passámos uma tarde e uma noite, sempre a andar, por estrada de terra batida, entre a selva e savanas, numa distância de quatrocentos quilómetros.
Quando tínhamos percorrido cerca de cento e cinquenta quilómetros, na zona do Dondo, o choufer, parou o camião na berma da estrada, por entre a floresta densa, para verificar a carga, e logo percebeu que duas malas que vinham em cima da carga tinham desaparecido. Deixou-nos, ali naquele deserto de floresta africana, acompanhados por dois ajudantes de raça negra. Apanhou boleia e seguiu para Luanda à procura das malas.
Nesse momento, tememos pela nossa vida, sentimo-nos entre a vida e a morte. Nunca tínhamos visto nem contactado com negros, e logo no primeiro dia em que pisamos solo angolano, fomos abandonados dentro da selva, de noite e junto de homens da raça daqueles que o meu pai meses antes, quando escreveu à minha mãe contava, e ouvíamos na rádio dizer que “se revoltaram e esquartejavam todos os brancos”.
Nós tremíamos de medo, e nem sequer sabíamos que aquele local, (do Dondo), estava inserido na zona dos ataques do UPA.
Já noite escura, vimos dentro da floresta, uns pirilampos, mas nós, que estávamos no início de 1962, e que tínhamos ouvido falar dos ataques de Fevereiro de 1961,que continuavam em grande escala, feitos pelos revoltosos no Norte de Angola contra todos os fazendeiros e trabalhadores dessas fazendas, temíamos que aquelas luzes não fossem de pirilampos mas sim dos revoltosos.
Os terroristas do UPA (União Popular de Angola) liderada pelo Lombumba, esquartejavam todos à catana ou com uma moca na cabeça e as crianças eram atiradas contra uma parede.
Era o terror desde o Distrito de Luanda até ao Cuanza Norte.
Muita gente, ali, foi chacinada.
Quem não aderisse ao UPA só tinha duas hipóteses: morrer ou fugir para Luanda e deixar tudo para trás.
A UPA era um movimento Macongo Ligado ao Congo. As populações eram obrigadas a ser evacuadas do Norte para Luanda, em aviões. Os negros dividiam-se entre a fidelidade aos colonos e os guerrilheiros. De início, durante essa evacuação, deu-se a vez às mulheres e crianças, todavia centenas tinham já sucumbido. Os maridos e pais dos que partiam ainda ficavam, juntamente com negros afectos ao patrão ou os Bailundos que
eram trabalhadores e afectos aos brancos, que eram de uma etnia rival aos que compunham a UPA.
Mas, tal como eu dizia, ao vermos os pirilampos tremíamos de medo daquelas aparições e temíamos que fosse algo pior.
Durante o tempo que ali permanecemos, vimos passar, atravessando a estrada, vários tipos de animais da selva africana.
Quatro horas mais tarde, o choufer apareceu e lá seguimos viagem.
Passado algum tempo, finalmente chegámos à cidade da Gabéla.
Quando chegámos à casa onde vivia o meu pai, colocámos lá as nossas coisas e depois ele levou-nos a uma casa feita de pau e coberta com ramagem de palmeira,

e qual não foi a nossa grande surpresa e admiração, quando ao olharmos para o tecto dessa barraca vimos dezenas de grandes cachos de bananas maduras ali penduradas.
Foi comer até fartar!
Lá ficamos a viver, numa fazenda de café, entre grandes árvores centenárias, entre os morros do Amboim, Cuanza Sul, perto das belas cachoeiras (quedas de água) onde o ar e as águas eram puras e os únicos barulhos que se ouviam eram os cantares dos belos pássaros que nidificavam por entre a ramagem das palmeiras, dos banzes, bananeiras, taculas, mulembas e cafeeiros.
Aquela era uma zona de muito cacimbo (nevoeiro). Nalgumas manhãs, ele era tão denso que apenas se conseguia vislumbrar o que quer que fosse a uma distância de vinte metros.
Só por volta do meio-dia, quando o Sol rompia víamos aquelas árvores repletas de pombos verdes. Eram tantos que por vezes havia árvores que continham mais pombos do que folhas. Estes viajavam em tão grande velocidade que perante o cacimbo não tinham tempo de parar antes de embaterem contra a nossa casa, que com a sua parede branquinha se confundia com o nevoeiro e acabavam por morrer.
De vez em quando, víamos passar por entre a selva, com plantações de café por baixo de arvoredo de grande porte, um comboio movido a lenha que fazia o trajecto de Porto Amboim à cidade da Gabéla, transportando mercadorias e pessoal. Embora fosse muito lento, este dava uma imagem bonita por entre a selva da montanha, conhecida como “Os morros do Amboim”.
Ali, na fazenda “Quitona” dependência da sede do “Congulo”, estávamos no mato, isolados de toda a civilização, não havia sequer uma escola por perto.

1 comentário:

  1. É uma história fantástica. Semelhante certamente à de muitos outros que foram para Angola... (Angola era como que uma coisa mágica. Foi assim que tambem em 1966 de navio aportamos em Luanda. Para mim era uma Magia tudo aquilo. As mesmas emoções, alegrias e medos de crianças recém-chegados a um mundo dsconhecido. Coisa linda essas histórias. Dava de escreve um Livro??!!
    Maria Lucilia
    Obs.morei cerca de 10 anos na Pambangala /Cela com meu irmão, irmãs e meus pais, que tinham fazenda.

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